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As Cartas Contam
Cartomancia & Espiritualidade
Textos

Cartomancia e Espiritualidade andam lado a lado?

 

Até este momento em que escrevo, "cartomancia & espiritualidade" é o slogan deste humilde site. Pode ser que quando você esteja lendo este texto, o slogan já seja outro. Estes dois termos talvez sejam os melhores para passar uma ideia dos assuntos tão abrangentes que podem vir a ser abordados por aqui. No entanto, muita gente pode se perguntar por qual razão estas palavras costumam andar de mãos dadas, como velhas amiguinhas. Afinal, cartomancia e espiritualidade andam necessariamente de mãos dadas?

 

Para filosofar sobre essa questão, vamos analisar cada uma das palavras, começando por cartomancia. O que é cartomancia? Mancia é um sufixo grego que significa algo como "adivinhação". Refere-se a previsão de futuro. Então, cartomancia refere-se ao uso de cartas para "ler o futuro", independentemente de quais tipos de cartas estamos falando. Aliás, este é o argumento que as Igrejas cristãs, em sua maioria, usam para condenar a prática da cartomancia. Afinal, o futuro a Deus pertence, segundo eles, e a Bíblia condena práticas de previsão de futuro (cá entre nós, a Bíblia condena tantas coisas que sequer são mencionadas nas Igrejas, não é mesmo?).

 

No entanto, é para prever o futuro que nós, cartomantes, abrimos as nossas cartas? Não posso falar por todos, certamente, mas hoje já existe um consenso entre a maioria de nós, praticantes dessa arte secular, de que as cartas não servem para ler o futuro - as cartas mostram é o presente. A previsão de futuro que as cartas fazem é baseada no momento presente.

 

Este é um assunto complexo, tema para um outro longo texto. E longe de mim querer impor esta visão aos meus colegas do ramo - se você é cartomante e discorda, eu adoraria se comentasse, expondo sua visão. Enfim, para explicar melhor o conceito de "ler o presente" e "prever o futuro a partir do presente", gosto de usar a analogia da Previsão do Tempo. Quando a Previsão de Tempo alerta para o risco de uma futura tempestade em determinada região, ela se baseia na direção que os ventos, as nuvens e a umidade estão seguindo agora, no presente. Claro que deve haver outros fatores envolvidos no cálculo, mas de maneira simplificada podemos afirmar que a Previsão de Tempo "prevê o futuro" baseada no fluxo meteorológico presente. E é mais ou menos assim que as cartas também funcionam. Se as cartas sugerem uma nota baixa no futuro, será que no presente o aluno está conseguindo estudar o bastante ou está se esforçando? Se as cartas sugerem um divórcio no futuro, será que no presente a relação está bem estruturada ou que ambos os parceiros têm condutas coerentes com a longevidade do relacionamento?

 

O fato de as cartas apontarem uma derrota no futuro, não significa que a derrota seja necessariamente inevitável – significa que o rumo que se está seguindo (agora) ou o rumo das situações (agora) tende a não ser o melhor. Se há outros rumos melhores a se seguir, as cartas podem revelar quais. Uma futura derrota mostrada nas cartas também pode significar que hoje existe uma tendência ou energia contrária às realizações, por qualquer motivo – e este motivo pode ser desvendado através das cartas. Claro que não podemos controlar tudo, e nem toda vitória depende unicamente de nós mesmos. Algumas derrotas são inevitáveis, e as cartas também nos preparam para os abalos que podem surgir e que estão além do nosso controle.  

 

Não é difícil concluir que as cartas funcionam melhor como uma ferramenta terapêutica do que como uma ferramenta de se prever o futuro. Portanto, cartomancia está longe de ser a palavra ideal para definir como eu uso as cartas, ou como grande parte dos meus colegas as usam. Mas há palavra melhor? Se você conhece uma, por favor, comente.

 

Que fique claro, então, que quando eu uso a palavra “cartomancia”, eu não me refiro exatamente ao seu significado literal, de se prever o futuro.  Quando eu uso a palavra “cartomancia” eu me refiro ao ato de “ler as cartas”, ao ato de encontrar uma resposta, uma mensagem ou conselho sobre qualquer assunto através delas.

 

E o que podemos falar do outro termo atualmente presente no slogan? Espiritualidade é um termo mais abrangente, com um sentido ainda mais profundo. No geral, espiritualidade é a busca ou a conexão do ser humano com o transcendental. A busca ou a conexão de uma pessoa com aquilo que transcende a ciência ou os conceitos científicos. Aquilo que transcende a razão, transcende a materialidade. Espiritualidade é um termo que não se refere a nenhuma religião específica, mas qualquer religião, ao buscar o divino e codificá-lo, está necessariamente vinculada à espiritualidade. Hinduísmo é uma expressão da espiritualidade humana, assim como o Catolicismo, o Protestantismo, a Umbanda, o Espiritismo e todas as outras religiões do planeta, das mais "tribais" até as mais tradicionais e reconhecidas globalmente. Mas não podemos afirmar que a Espiritualidade se define em qualquer uma das religiões que existem, pois a espiritualidade transcende a religião. Praticar magia é também expressão da espiritualidade humana, inclusive magias de "baixa frequência", pois espiritualidade está além dos valores morais e éticos. Se a espiritualidade é do tipo que eleva a nossa alma ou que nos mantém mentalmente, emocionalmente ou espiritualmente presos ou limitados, isso é outra história.

 

Resta sabermos por que é tão comum ver a cartomancia sendo associada com a espiritualidade. O tema é bem complexo, mas já vou dar o spoiler: a leitura de cartas normalmente utilizadas para cartomancia (como Tarô, Baralho Cigano, entre tantos outros) não é exclusividade dos filhos, pais ou mães de Santo. Assim como não é exclusividade de bruxos, bruxas, pagãos. O uso dessas cartas não está vinculado a nenhuma religião. O uso dessas cartas não é exclusividade nem mesmo dos que acreditam na existência de um Ser Superior (ou vários Seres). Afinal, as cartas podem ser usadas para INSPIRAR. Não há lei ou regra que proíba o uso das cartas simplesmente para inspirar ideias, sugerir possibilidades, mesmo que as cartas sejam manuseadas e interpretadas por quem não crê na ferramenta oracular.

 

No entanto, a grande maioria das pessoas que utilizam as cartas possui crenças e rituais místicos próprios que se integram na leitura. São cartomantes que adornam suas mesas com pedras, conchas, imagens de Deuses, Orixás, Entidades, Santos, Anjos e até Demônios. A religião ou crença particular de um cartomante não o torna melhor ou pior do que qualquer outro colega do ramo em sua interpretação das cartas. Um cartomante usando turbante e com oito quilos de guias no pescoço não lê as cartas com mais assertividade do que um cartomante de jeans e camiseta. Mas o fato de o cartomante possuir uma fé, independente de qual seja essa fé, pode ajuda-lo no processo da leitura. Se a fé não é em uma entidade, santidade ou divindade, que seja a fé em si mesmo, em seu próprio potencial – o que não deixa de ser, também, uma expressão de espiritualidade. E um cartomante conectado com sua própria espiritualidade tende a ter mais calma no momento da leitura e mais força intuitiva.

 

Se pararmos para analisar, não é tão difícil supor por que a cartomancia abraçou tanto a espiritualidade ao longo dos séculos. Para o mais cético dos céticos é até razoável aceitar que determinadas cartas na mesa estejam contando uma história. O que o cético dos céticos não consegue compreender é o motivo que levou o cartomante a escolher exatamente as tais cartas que estão na mesa contando a tal história. Nem o cartomante sabe exatamente por que escolhe as cartas certas depois do embaralhamento, apesar de algumas teorias levantadas ao longo do tempo para se compreender tal fenômeno. A teoria mais empregada no mundo moderno para explicar o motivo de "escolhermos as cartas que devem ser escolhidas" refere-se ao conceito de sincronicidade de Jung, onde a escolha das cartas seria, supostamente, uma manifestação do inconsciente ou um reflexo do estado psíquico do consulente. 

 

Particularmente, acho importante que existam essas teorias, mas para mim são abstratas demais e sem tanta relevância prática. Gosto de pensar que a escolha das cartas é manifestação de uma chama divina, um princípio divino que reside em cada um de nós.

 

Não é apenas o mistério da escolha das cartas numa tiragem que torna a cartomancia uma parceira de longa data da espiritualidade. A razão mais explícita dessa associação é principalmente histórica. Alguns autores e pensadores ao longo dos séculos foram os principais propagadores de uma visão mais mística sobre a cartomancia. Mas o papo é longo, meus amigos, e provavelmente falaremos desses personagens num futuro próximo.

As Cartas Contam
Enviado por As Cartas Contam em 09/03/2025
Alterado em 12/03/2025
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